A nossa compreensão de mundo é binária e de oposição. Oposição, neste sentido, não é de exclusão, mas de complementação. A oposição é identificadora e evitamos a ambigüidade porque buscamos o ser procurando-se evitar o pode ser. Ser é uma utopia, um modelo, a nossa procura; permanecemos nos limites pode ser na certeza que somos.
A vida em sociedade, desta forma, se torna uma expectativa e não uma realidade. É ambígua de fato, mas precisa e clara nas nossas definições.
Parece-me que a maior das ambigüidades é a dicotomia sagrado e o profano. Os nossos olhos estão no sagrado e os nossos pés no profano. O sagrado é o modelo e o profano é o chão onde pisamos. Vê-se o sagrado como origem e destino e o profano como o chão onde se pisa. E que não olhamos para ele porque os nossos olhos estão no modelo.
Existe uma área de fronteira entre estes dois mundos ocupada por um sem número de manifestações religiosas, cada uma gerando explicações acerca do pode ser e do deve ser. Há muita demanda que varia de acordo a imposições de ordem econômica, política, pessoais que empurram as pessoas na busca de explicações para elas inexplicáveis nos seus dia a dia.
A tecnologia, como a práxis da ciência, é uma agente poderosa com capacidade de organizar e desorganizar a esta área de fronteira entre estes dois mundos. E tem permitido a construção de novos mundos que nos permitem o papel de heróis civilizadores tal qual aquele que chamamos de Deus.
Depararemos, aqui, com uma nova ambigüidade conhecida como mundo virtual.
O objetivo deste canto de reflexão não é o de convidar as pessoas a viver na virtualidade, mas de refletir e de entender este mundo por onde transita muita gente. Umas pessoas físicas, reais, e outras virtuais, com todas as características de pessoas físicas, mas que são emulações ou, na linguagem da informática, pessoas que são como se fossem e aceitas como tais, mas que têm as suas vidas intercaladas pelo liga/desliga dos computadores.
Há uns anos participei de um livro que falava sobre namoro na Internet com um capítulo Sem lenço nem documento (SAMPAIO, Alice. Amor na Internet. Quando o virtual cai na real. Rio de Janeiro: Record, 2002) onde discuto questões de territorialidade e desterritorialidade e como o namoro acontece no espaço desterritorializado.
Muitas aconteceram nesta década em termos de desenvolvimento de equipamentos, softwares e no rastro os sites de relacionamento que tornam as conversas, o contato mais presente, trazendo o virtual para mais perto do real ou levando o real para mais próximo do virtual. Não só nos sites de relacionamento, mas também em praticamente todos os setores da vida, até nos veículos em que a tecnologia tem substituído muitos atos que julgávamos essencialmente humano.
Não teremos aqui um saco de gatos, mas uma gama de atos, atitudes, definições, consideradas distantes, diversas, os são partes de um conjunto muito próximas, confundindo-se uma com as outras.
As discussões estão abertas.