sexta-feira, 24 de março de 2017

Os porcos e os suínos

Em Curitiba circulava o jornal O Dia. Os meus pais eram assinantes deste jornal e eu seu leitor assíduo. Foi este jornal, vendido a quilo, que permitiu comprar o vidro do ginásio, que contei numa das minhas lembranças em Morretes Notícia. Era eu que sempre estava em casa quando Dagoberto vinha entregar o jornal, ansioso para ler a charge do Chico Fumaça. Fico pensando: acho que errei de profissão; deveria estudar jornalismo. Josué, filho da Dona Rosinha, neto de Dona Isaura, talvez tenha sido o primeiro morretense a ingressar num curso jornalismo. Senti aquele clique de quem diz: por que não fiz? Falo isto, pois gostava de dar as notícias em primeira mão. Mas o que é a etnografia se não contar histórias? Do Chico Fumaça e outras notícias interessantes para mim, na fase de pré-adolescência e na adolescência. Os comentários e as críticas muitas vezes contundentes, mas numa linguagem que o pré-adolescente e adolescente imaginava ser para ele.

 Eu era leitor de Chico Fumaça e da coluna do Elói Montalvão, dois personagens de um só autor, Alceu Chichorro. Chico Fumaça, Dona Marcolina pareciam ser o seu altar-ego. O foco deste colunista, fui compreender depois, era a política.

Na Morretes da minha geração a política era algo muito próximo e o sistema partidário de então era bem representado. Getúlio Vargas criou dois partidos, o PSD para os ricos e o PTB para os pobres. Para a pequena burguesia ficou a UDN. Morretes era dividida pelo futebol e pela política e o PTB era muito forte na passagem da década de 40 para a de 50. Em 51 conseguiu eleger seu Corrêa Lima, prefeito de Morretes. Se a memória não falhar, Juca Pereira era o seu vice. Mas, me lembro bem, era o dirigente do PTB morretense. Corrêa Lima era chefe de trem e Juca Pereira o concessionário do bar da estação ferroviária. Os ferroviários, quase todos, eram petebistas.

Todo morador de cidade pequena é bairrista; ver uma referência à sua cidade, mesmo que seja implícita, fica radiante. Como no dia em que li o comentário de Eloi Montalvão que um prefeito de uma cidade do litoral, ex-chefe de trem, recebeu um manifesto de carga onde constava que na composição havia dois vagões com suínos. Corrêa Lima, ao fazer a conferência da carga, enviou um telegrama informando que os dois vagões de suínos não faziam parte da composição, mas que havia dois vagões de porcos não relacionados no manifesto. Juca Pereira escreveu para o colunista falando da injustiça contra Corrêa Lima, um bom homem (realmente era!). Elói Montalvão publicou a carta de Juca Pereira e logo abaixo respondeu que não citara nome e que se a carapuça serviu, não tinha culpa. O silencio é a melhor forma para não vestir carapuças.


Este  texto foi publicado em http://www.morretesnoticia.com.br e em mcherobim.multiply em 29-Jul-2007, sites que não mais existem.

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