Eu me inscrevi no Multiply há certo tempo[1]; não me lembro se convidado por alguém ou "cai" por aqui por um dos tantos caminhos que navegação da Internet nos oferece. De uns tempos para cá comecei a receber convite e informação de minha amiga Itamara.
Eu tenho dois prazeres na vida. Na verdade, tenho muitos. Mas aqui eu me restringirei a dois: ler e escrever. Não é nesta ordem, e até pode ser, pois eu não sei qual seria a ordem de preferência. Da minha preferência.
Ler é cômodo. Paramos e continuamos quando bem entendemos. Lemos diferentemente de acordo com o assunto. Por vezes começamos da primeira página e vamos até o final; outras vezes, como nos livros técnicos, vamos lendo aos pedaços como se fossem manuais; algumas vezes transformamos o livro numa obra de referência, pois a nossa leitura foi aquela chamada "leitura transversal". Eu acho que são estes livros que nos marcam mais presença, sem nunca os ler como mandam os bons modos. Mas existem aqueles que nunca terminamos. Porque para nós são os melhores; terminar uma leitura de um livro é como colocá-los na (nossa) história, no passado; aqueles que nunca terminamos é porque queremos que estejam sempre no presente.
O final de uma leitura é o momento formal de se colocar o livro na nossa história. Mesmo que não se confesse, ele vai partilhar da poeira das prateleiras de nossas estantes. Provoca um complexo de culpa; para aliviar esta culpa, por vezes, vou lá folheio, ou uma olhada em alguns tópicos, fecho e devolvo à prateleira. Eu faço isto com as teses, dissertações e trabalhos de término de curso que orientei ou examinei. Estes trabalhos têm um problema: o da leitura compulsória, por dever de ofício. Mas ao fazer isto, lembro de pessoas. Com alguns mantenho contato e outros sumiram. Por onde andarão? Talvez - ou na certeza - mergulhados nas suas tantas obrigações. Ali estão anotadas algumas observações, importantes no momento da argüição que o tempo se obriga em diluir a sua importância.
A Internet, com a possibilidade de se comunicar através de e-mails, site de relacionamentos do tipo do orkut, gazzag e outros, messengers, etc., e com o nosso nome nos sites de busca, fazem com que sejamos encontrados. Estes encontros vêm com algumas lembranças: lembra-se do que você falou? Puxa, aquela sua observação... E por ai vai... Temos que reconhecer que o professor é uma pessoa pública.
Aquela leitura chata, empanturrada de expressões típicas de um snobismo acadêmico, traz os seus bons frutos e médio ou longo prazo, não pelo que está escrito, mas pelas pessoas que estão por trás daquilo que lemos.
E escrever? Quando entrei no pós o meu orientador me advertiu: você escreve em italiano, mas com palavras portuguesas. Eu? O que é isto? retrucava em pensamento, não existe brasileiro mais legítimo que eu. Até quando eu o acompanhei a Pedrinhas, um núcleo de colonização italiana, hoje município do oeste paulista. Ele não me levou para um confronto étnico, mas porque tinha idéia que eu continuasse o trabalho, e que isto fosse feito por um italiano. Na verdade um "italiano", ou alguém italianado.
Esta idéia de "autenticidade brasileira" foi para o brejo. Nunca havia me sentido um italiano e me via não sendo mais o brasileiro que imaginava ser. Que diabo eu sou? Como escrevo "em italiano" se não sou italiano, mas como uso a estrutura italiana se sou brasileiro? Mandei às favas esta questão de identidade e resolvi partir do que eu era. Mas era o que, se nem eu sabia? Ah, sou isto! O negócio é soltar no "ponto morto" (posteriormente, "na banguela") e ver onde vai parar.
Por que eu era italianado? Eu nasci em Morretes, onde foi criada a primeira colônia de italianos do Paraná e eu nasci e me criei em um dos seus núcleos, o do Central. Revendo o passado, havia uma coesão étnica, aproximando-os territorialmente, apesar de os núcleos estarem separados no espaço físico, na prática religiosa, nos interesses políticos, no futebol, etc. Portanto, não havia jeito de ser diferente.
Naquele momento eu tinha duas coisas pela frente, essenciais para terminar o meu pós graduação: continuar as minhas pesquisas juntos aos guarani[2] () e aprender a escrever, é claro.
Quando fui aluno da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo adquiri um anuário antigo da escola. Numa de suas partes ensinava a escrever. E lá havia uma orientação: a linguagem cientifica deve ser redigida em frases curtas e na ordem direta. Eureka! É isto, pensei. E comecei a colocar em prática. Partir daí eu me tornei um leitor de manuais de redação. Numa das leituras havia um conselho: respeite o leitor: use palavras conhecidas para evitar que o leitor leia o seu texto com um dicionário na mão.
A erudição com vocabulário rebuscado é uma forma de usar o segredo como forma de poder; a erudição desejada é aquela que torna inteligível ao leitor comum pensamentos muito elaborados. De transmitir ao leitor emoções através da palavra escrita. Este é um treinamento sem fim, mas que satisfaz a quem escreve.
Portanto, eu gosto de escrever, ou melhor, de treinar a escrever contando e comentando coisas. É o que pretendo fazer aqui. Mas somente poderei fazer isto com o auxílio dos meus eventuais leitores.
[1] Este texto também está publicado em http://mcherobim.multiply.com/journal/item/1/1 . Estou trazendo alguns textos de lá para cá.
[2] Não errei a concordância em número. Existe uma norma de grafia de nomes indígenas, segundo a qual eles são invariáveis em gênero e em número.
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