Cada
vez que chego a Morretes, sinto nos meus ouvidos os sons dos sinos da matriz:
quando tristes, entristeciam os morretenses; quando alegres, alegrava a
todos. Cada “música”, isto é, cada batida, identificava uma
atividade religiosa, mas também havia uma batida para a comunidade.
Sou
de uma geração que nasceu e se criou ouvindo os sinos da Igreja Matriz. Eu fui
um dos sineiros da Igreja.
Na
torre da Matriz havia quatro sinos, numerados do menor ao maior, em primeiro,
segundo, terceiro e quarto. Cada sineiro se especializava num
deles. Os primeiro e segundo sinos eram os “de repique” e eram tocados por um
só sineiro e dava o ritmo e o quarto fazia um acompanhamento, surdo, e era o
responsável pelas e emoções. Pelas tristezas e pelas alegrias. O terceiro
intermediava o “diálogo” dos sinos menores com o “solo” do quarto. Neste
momento a cidade ficava alerta: alguém havia falecido. Quem? Logo a notícia se
espalhava. E assim as batidas anunciavam um acontecimento, uma atividade. Era a
forma de como as informações chegavam aos moradores de uma cidade com cerca de
cinco mil habitantes.
Quem
eram os sineiros? Eram meninos no início da sua adolescência. Coroinhas.
Sacristãos, como eram chamados. Mas não
eram todos que ficavam com a chave da porta da torre, como não era qualquer um
que “tocava sino”. Para tal, teria que ter a autorização do responsável, alguém
de confiança do padre. Ou do capelão, caso do Roberto França, na igreja de São
Benedito.
Os
mais experientes treinavam os novos. Os antigos, já adultos, eram citados como
exemplo pelos “instrutores” aos aprendizes. Os mais citados, na época, eram
Osman de Oliveira e Airton Onoles. Havia o Ari Bicudo e alguns que no momento
não lembro outros nomes, mas sempre havia uma dupla ou um trio. A dupla que
mais se destacava era a “especializada” nos dois sinos menores e no maior. Por
muito tempo eu fiz parceria com Valdinho Colodel. Ele nos dois menores e eu no
quarto sino.
Osman
e Airton, até onde alcança a minha memória, foram os últimos coroinhas
(sacristãos) do Pe. Saveniano. Eu e Valdinho fomos do primeiro grupo de
coroinhas do Pe. Camargo.
Relembrando, a partir de hoje, o Pe. Camargo fez tudo para apagar da memória as lembranças do seu antecessor.
Relembrando, a partir de hoje, o Pe. Camargo fez tudo para apagar da memória as lembranças do seu antecessor.
Os
coroinhas tinham outras responsabilidades na Igreja e por isto eram os que mais
se destacavam como sineiros. Não sei nas gerações passadas, mas o padre nos
remunerava. Também éramos sineiros da Igreja de São Benedito, que tinha como
capelão o Sr. Roberto França.
Muitas
vezes a dupla estava livre para bater sino. Quando somente um batia o sino,
repicava os sinos menores com as mãos e o maior com a corda do badalo amarrada
num dos pés.
A
sonoridade antiga que sinto nos ouvidos contrastava com a batida monocórdica
atual. Numa das minhas visitas a Morretes convidei Valdinho para transmitirmos
o nosso conhecimento para os meninos e meninas atuais. Não foi possível porque,
segundo lhe informaram, havia mais de um sono rachado. Deitado de costa no chão
da torre, é claro.
Faço
um convite aos morretenses para arrecadar fundos para recuperar os sinos; eles
são da comunidade. Não sei se este convite ainda tem significado sete anos
depois que publiquei este texto.
(*) – Publicado, originalmente, em Morretes
Notícias, Edição nº 2, janeiro de 2007.
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